domingo, 1 de dezembro de 2013

O queijo e os vermes - Carlo Ginzburg


De forma geral existe toda uma série de fatores ao nosso redor formando nossa subjetividade. Nosso ser é único, sempre será, porém compartilhamos de muitas experiências em comum, e elas, da mesma forma que as pessoais (como nossa criação, a escola onde estudamos, nossos amigos), enquanto experiências coletivas também são importantes. Estamos inseridos num tempo e numa sociedade. Nascer no Rio de Janeiro da segunda metade do século XIX implica em questões diferentes da de nascer no interior do estado de Santa Catarina no final do século XX. Outro tempo, outras questões, outras subjetividades. Não podemos esquecer dos elementos que nos cercam.
Entretanto cada sujeito é um ser, e por isso devemos ser cautelosos ao abordarmos a existência humana – até porque se fosse assunto fácil não usaríamos tanto de nosso tempo discutindo isso. Apesar de haverem estas experiências compartilhadas, os efeitos não são necessariamente sempre os mesmos. A exemplo de um certo livro numa certa biblioteca, nem todos que o lerem terão a mesma impressão ou conclusão, cada sujeito faz a sua própria interpretação de mundo. Curioso é lidar com situações que escapam do que supúnhamos ser uma margem de erro e improbabilidade.
A sedução de Ginzburg pela fonte base do livro, um processo inquisitorial sobre um moleiro alfabetizado com sua própria forma de conceber o universo, a religião e o mundo, escapa de nossas expectativas referentes a este tempo, um sujeito externo as classes privilegiadas que sabe ler e escrever, compra seus livros (algo muito caro para época) e os interpreta! O curioso é que seus conterrâneos o denunciam para o Santo Ofício, iniciando assim seus problemas.
A princípio tudo o que ele queria era poder falar para pessoas dispostas a ouvi-lo e responde-lo. Podemos perceber nisto tudo uma vontade de aprender a desenvolver suas teorias. Entretanto nada disso estava nos planos da Santa Igreja. Com o surgimento da Igreja Luterana os católicos estavam desesperados e intensificaram muito sua caça as bruxas e hereges – mais do que nos “sombrios” tempos da Idade Média. A Igreja Católica percebeu que as ideias eram perigosas, afinal, tantos concílios para padronizar a concepção de cristianismo provam isso. Menocchio desenvolvendo sua própria teogonia, entraria em conflito direto com os interesses Católicos. O questionamento é sempre mais libertador do que a resposta, mas para isso um preço precisaria ser pago. Logo temos um sujeito incrível, que não se contenta em apenas aceitar o mundo ao seu redor, como procura também dialogar com ele, porém seu tempo é marcado pela perseguição católica aos hereges, bruxas e afins.
Podemos indagar uma questão no caso trabalhado por Ginzburg que é problematizada por Plekhanov e se mostra relevante atualmente: até onde pode um indivíduo afetar a história? Ou seja, quão relevante é um indivíduo para as delimitações de um tempo? Não devemos cair num simplismo e inocência colocando a estrutura e o sujeito em lados opostos e verificarmos qual pesa mais na balança da história. Ocorre uma troca constante entre ambas as partes, já que uma estrutura é sustentada pelos sujeitos que vivem nela e a estrutura sustenta a sociedade em que vivem estes sujeitos. Quem faz e mantém uma estrutura funcionando são as pessoas, não há dúvidas quanto a isto, entretanto até onde a vontade de um sujeito transforma a sociedade? O que podia um pobre moleiro italiano contra a inquisição? E ao mesmo tempo, quantos moleiros foram queimados para que a inquisição (e o poderio da Igreja) acabassem?
O que devemos ter em mente quando pretendemos estudar algum momento histórico são duas coisas básicas: uma delas é que existem uma série de questões cercando o sujeito, em especial seu tempo e sociedade, outra é a de que nem todos os sujeitos aceitam muito bem este julgo que recai sobre a formação do ser. Onde há poder, há resistência. E como pergunta final deixo, como mudar uma estrutura sem entendê-la? Até onde é possível...?

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