terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Estética da Ginga - Paola Berenstein Jacques

      
Várias vezes Lucien Febvre usará a expressão “combates pela história”, mesmo que esta frase seja pouco clara ela indica que o francês sabia muito bem dos jogos de poder em que a História está inserida e faz parte – independente de sua vontade. De alguma forma acredito que um dos nossos desafios contemporâneos dentro da sociedade brasileira seriam “combates pela cidade”. Moramos em cidades péssimas, e neste quesito nada melhor do que a copa para ilustrar isto. Não podemos fugir de nossa história, negar nosso passado é tão difícil quanto fugir do saudosismo. Sobre este problema urbano que nossa realidade concreta nos impõe, a teoria rizomática pode ajudar muito.
De maneira geral e resumida, as cidades brasileiras não passaram pelo rígido esquema de quadras de nossos vizinhos colonizados por espanhóis. Quando observamos esta grade nas cidades coloniais, percebemos que a rigidez é outra, Paraty não é tão geométrica como Colonia del Sacramento, mesmo que nossa percepção indique que ambas seguem um mesmo “plano diretor”. O que ocorre é que nossa geografia e constituição também é outra.
O grande roteiro das reformas urbanas no Brasil (muitas vezes ainda) seguem o estilo do “bota abaixo”, ou da demolição do cabeça de porco, episódios já bem documentos que ocorreram no Rio de Janeiro – então capital do país[i]. O plano é simples, a constituição presente da cidade não atente os desejos de modernidade da época, então destroem todo e refazem a cidade, seguindo um plano de forte inspiração (e cópia) europeia. Neste sentido os grandes alvos são os cortiços, e logo em seguida as favelas.
Não há cidade no Brasil que não possua uma favela ou algo que se assemelhe a isto. No geral chamamos de favela lugares onde as habitações apresentam inúmeros problemas habitacionais como: mobilidade, saneamento, desmoronamento... Sabemos e não negamos que as favelas apresentam problemas de urbanidade. Porém o interessante é observar que durante anos o modelo seguido é um puro fascismo urbanistico, não abrindo mão de tratores para demolir tudo que está ali e reconstruir novamente algo o mais próximo possível de ideais iluministas/cartesianos. Nisto ainda somos reféns das quadras.
O rizoma ajuda a combater este fascismo urbanista, nos faz compreender de que não precisamos destruir uma favela para torná-la aprazível. Nos ajuda a entender que a favela é uma constituição diferente de urbanidade e para lidar com ela não precisamos destruí-la, mas sim compreende-la e aceita-la. E querendo ou não as cidades brasileiras se constituem de forma muito mais semelhante (e rizomática) as favelas do que ao rígido e geométrico plano de quadras. Esta é nossa realidade, não por acaso foi aqui que o conceito de bricolage ganhou forma, parece que esquecemos disto.



[i]  Para mais detalhes recomendo ver: CHALHOUB, Sidney. Cidade Febril: cortiços e epidemias na Corte Imperial. São Paulo: companhia das Letras, 1996.

Nenhum comentário:

Postar um comentário